HIDROGINÁSTICA E A
HIPERTROFIA MUSCULAR
A Hidroginástica é um dos exercícios
mais indicados e procurados nos centros de esportes, academias e clubes. Parte
de sua popularidade se dá pelo mito de que é de baixa intensidade, sem riscos e
contraindicações (o que na maioria das vezes não é verdade!). Muitos benefícios
são colocados na conta desta atividade, a saber: melhora da autoestima, melhora
do equilíbrio, melhora da flexibilidade, melhora do condicionamento
cardiorrespiratório, melhora da composição corporal, aumento da densidade
mineral óssea, aumento da força e hipertrofia muscular...fora as indicações
para os mais variados grupos específicos (gestantes, idosos, obesos,
cardiopatas etc...). Boa parte das indicações supracitadas carece de
comprovação científica e ficam no âmbito do senso comum.
O
tópico abordado a seguir tenta lançar luz para uma questão relativamente
polêmica em relação à Hidroginástica e suas vertentes. O GANHO DE FORÇA E
HIPERTROFIA MUSCULAR NOS EXERCÍCIOS AQUÁTICOS.
Antes
de entrar na discussão sobre o desenvolvimento de Força Muscular (FM) e
Hipertrofia Muscular (HM) através da prática de Hidroginástica, é importante
contextualizar esta atividade. Ela é composta de movimentos acíclicos, fontes
energéticas variadas (mista) e por ser no meio líquido uma série de mudanças
nas respostas fisiológicas e na dinâmica do movimento ocorrem, ou seja, a
modalidade em questão deve ser analisada sempre levando em consideração estes
fatores, principalmente quando falamos em comparação com outras atividades
terrestres.
É
importante ressaltar que o nome Hidroginástica engloba uma série de modalidades
aquáticas, como: Hidropower, Aquafit, Deep water, Aquacross etc..., algumas de
fato com propostas diferenciadas e outras apenas nomenclatura para efeito de
Marketing.
Feita
a introdução pode-se agora discutir os efeitos da Hidroginástica como sobre a
FM e HM.
PONTO
1 – Para abrir a discussão é necessário entender quais os tipos de aulas
estamos analisando. Não é de fato esperado que tenhamos ganhos importantes em
FM e HM se o programa de aula abrange mais a parte cardiorrespiratória (o que
representa a maioria das aulas), ou seja, não tem ganho em FM e HM porque não é
o objetivo da aula. Seria o mesmo que um professor no salão de musculação
passar uma série de 45 minutos correndo numa esteira para um aluno com objetivo
estético de HM. Neste caso eu preciso ser específico e óbvio, para ganhar força,
preciso treinar força.
PONTO
2 – Partindo do princípio que a sessão de aula será voltada para o treino de
força, temos aqui outro problema. O meio líquido apresenta algumas limitações
para o treino de força, a saber:
-
Tipo de contração diferente no meio líquido, onde temos mais ações concêntricas
do que excêntricas;´
-
Respeito ao principio da individualidade – com turmas heterogêneas
(característica da Hidro) é mais difícil controlar os treinos de cada aluno. A
série acaba sendo para a turma e não para o aluno;
-
Sobrecarga – Em relação ao treino contra a resistência fora d´água observa-se
uma grande diferença, pois fora d´água o controle da carga é mais fácil e o
limite de carga é muito alto, ao passo que na Hidro eu teria talvez 3 tipos de
graduação em alguns equipamentos. Em suma, progressão de carga prejudicada;
-
Manutenção da intensidade – Como na água a resistência está ligada diretamente
com a velocidade de execução, há uma dificuldade de o aluno manter esse
controle durante o tempo proposto ou durante as repetições.
Conhecendo
as limitações, você poderá tentar minimizar as mesmas e obter resultados mais
satisfatórios de FM e HM no meio líquido.
PONTO
3 MINIMIZANDO AS LIMITAÇÕES
-
Tipo de contração – Por muitos anos acreditou-se que as contrações no meio
líquido seriam 100% concêntricas e isocinéticas, porém PöYHONEN et.al (2001) demonstraram
através do EMG que a redução da atividade agonista ocorreu coincidentemente
durante o final do movimento com atividade excêntrica dos antagonistas em
repetições de extensão e flexão do joelho. Isto é em parte por causa do fluxo
padrão da água, desaceleração do movimento da perna e pré-ativação antes da
mudança na direção do movimento.
Aí está um exemplo para
minimizar um ponto negativo que é a menor participação de fases excêntricas nos
exercícios na água, pois é sabido que o treino concêntrico-excêntrico é
superior ao concêntrico- concêntrico para desenvolvimento de FM e HM (HATHER,
et.al. 1991; HIGBIE, et.al. 1996; FARTHING, et. al. 2003).
Deformações causadas por
ações excêntricas – possivelmente pelo grau de tensão maior sobre cada
fibra muscular e o fato de neste tipo de ação, o músculo ser alongado. (fonte: HORTOBAGYI
et. al. (1998)).
De toda forma as ações
concêntricas continuam predominando nos movimentos realizados no meio líquido,
a não ser que utilizemos flutuantes, elásticos ou os mal afamados pesos
(equipamentos muito densos), este último que na verdade descaracterizaria a
atividade.
Analisando os equipamentos
para a Hidroginástica podemos observar o quão é difícil utilizá-los para
promover mais ações excêntricas. Os flutuantes e os elásticos chegam a um ponto
de resistência tal que o corpo não consegue ficar em equilíbrio no meio
líquido, pois não há base para o aluno se segurar (princípio de Arquimedes –
“quando um corpo está parcialmente ou completamente imerso em um líquido ele
sofre um empuxo para cima igual ao peso do líquido deslocado”) (BRASIL & DI
MASI, 2006)
Sendo assim os equipamentos
mais utilizados para o trabalho de força na água são os resistidos (ou de
arrasto), que aumentam a resistência pela maior área de contato, mas também
neste caso a contração predominante seria a concêntrica. Para maiores detalhes
sobre os tipos de equipamento assistam a vídeo/aula https://www.eventials.com/pt-br/dudufaleiro/novas-tendencias-na-hidroginastica/.
Em relação ao controle da intensidade a solução pode ser
utilizar algum tipo de escala de percepção de esforço, como utilizados nos
estudos de Souza et al (2010) e Colado et. al. (2012), ou simplesmente
estabelecer um tempo ou número de repetições e exigir manutenção de uma
velocidade próxima da máxima.
Já a questão de turmas heterogêneas, o professor pode
criar turmas específicas para o treino de força na água e de certa maneira uniformizar
mais a turma ou dedicar um esforço maior para individualizar o treino em turmas
heterogêneas.
PONTO 4 – NÚMERO DE REPETIÇÕES OU TEMPO DE TENSÃO.
Quando se fala em trabalho de FM e HM no meio líquido,
logo se associa ao número de repetições tradicionalmente utilizado fora d´água
(séries de 6 a 12 RM). Entretanto no meio líquido fica difícil imaginar que
tipo de exercício mesmo com equipamentos forneceria resistência suficiente para
restringir em 12 ou 15 RM, ficando claro aqui que está premissa não funciona no
trabalho de hidroginástica.
Não obstante, alguns autores
vêm questionando o paradigma de baixas repetições e alta carga como sendo o
único recurso para volume muscular. Van Roie et al. (2013) estudando
idosos(população muito encontrada na hidro) verificaram que séries de 10 RM, 60
RM ou 80 a 100 RM são igualmente eficazes para hipertrofia quando terminando
com falha muscular. Consoante com o estudo anterior Schoenfeld et al.(2014) em
um estudo de meta análise evidenciaram que o trabalho de 50% ou menos de 1RM
pode melhorar a FM e HM substancialmente em indivíduos destreinados,
demonstrando assim que o tempo de tensão é também importante. Estes dados
demonstram que não se deve ficar preso a alta carga e baixa repetição nas atividades
no meio líquido.
Apesar dos resultados
promissores para um número maior de repetições no trabalho de FM e HM, ainda
persiste o problema de no meio líquido o trabalho muscular ser diferente (com
mais ação concêntrica). Uma hipótese seria trabalhar com um número maior de
repetições na água até a falha muscular, pois se analisarmos a contração fora
d´água, em um trabalho de 10 RM de flexão do cotovelo, o bíceps braquial estará
sobtensão em 20 movimentos (flexão concêntrico e extensão excêntrico) e já na
água seriam 10 rep concêntricas com o bíceps e 10 rep concêntricas com o
tríceps, ou seja, (em teoria) devíamos no mínimo dobrar o número de repetições
no trabalho aquático.
Tendo em vista o supracitado,
recomenda-se para o treino de FM na água:
a) Aumento
da velocidade de execução dos exercícios, pois no meio aquático o
arrasto aumenta com o
quadrado da velocidade. (importante ressaltar que a velocidade de execução não
prejudique a postura e a amplitude do movimento);
b) Aumentar a área de contato (maior arrasto de
forma ou resistência frontal) aumentando a sobrecarga;
c) Explorar as trocas de direção, onde há uma desaceleração
do movimento e pré-ativação antes da mudança na direção;
d) Aumentar
o número de repetições, não ficando no tradicional recomendado para fora
d´água;
e) Criar
um planejamento das aulas, dividindo por grupos musculares e objetivos;
f) Monitorar
o treino e avaliar constantemente.
O QUE AS PESQUISAS DIZEM
SOBRE AS RESPOSTAS DE FM E HM COM O TREINAMENTO AQUÁTICO?
O estudo mais promissor no
meio líquido é o de PöYHONEN et.al (2001), que teve como diferenciais três
pontos importantes: trabalhou com mulheres jovens (até então e ainda hoje os
trabalhos focam nos idosos) e utilizou para medir a variação de FM e HM
equipamento isocinético e tomografia computadorizada respectivamente,
conferindo um grande peso a este estudo. O “n” foi de 24, idade média 34.2 anos,
foram dividas em 2 grupos/ controle e experimental, duração de 10 semanas para um
treinamento de resistência de extensores e flexores do joelho com um
equipamento resistivo (ver vídeo/aula link acima). Os resultados apontaram aumento
do torque isométrico de 8% e 13% isocinético. A tomografia computadorizada
revelou aumento da massa muscular do quadríceps em 4% e 5.5% dos isquitibiais.
Estes resultados foram seguidos de uma série
de estudos sobre o tema e em particular um grupo brasileiro vem se destacando
na temática. O grupo de pesquisas em atividades aquática e terrestres (GPAT)
comandado pelo experiente Dr. Luiz Fernando Martins Kruel produziu uma série de
investigações sobre a FM com o trabalho aquático, demonstrando ser possível o
desenvolvimento de força com a prática regular de hidroginástica.
Souza et. al. (2010) avaliaram
20 mulheres jovens divididas em grupo experimental e grupo controle e encontraram
melhora estatisticamente significativa (p<0,05) na FM após 11 semanas de
treinamento no meio líquido para o grupo experimental para vários segmentos
avaliados.
Kruel et al. (2005) compararam
a FM após 11 semanas de treino específico de força na água, encontrando melhora
no grupo que realizou os treinos com equipamento e no grupo que realizou sem
equipamento, enfatizando com estes resultados que a velocidade de execução pode
ser tão importante quanto à sobrecarga pela área de contato no trabalho
aquático.
Colado et al. (2012)
compararam os resultados de um programa aquático com elásticos, equipamentos de
arrasto e exercícios de pesos fora d´água para massa corporal magra. Resultados
abaixo.
Tsorlou et al.(2006)
estudaram os efeitos de 24 semanas de treinamento aquático sobre a força e
composição corporal de mulheres idosas (+ de 60 anos) e encontraram resultados
interessantes para aumento da força e mudanças na composição corporal,
concluindo que o exercício aquático pode ser uma alternativa para melhorar a FM
em mulheres mais velhas.
·
Os tipos de força
Existem vários tipos de
treino de FM e em especial para força explosiva o exercício aquático vem se
mostrando um bom aliado. Stemm & Jacobson (2007) compararam o treino
pliométrico dentro e fora d´água, ambos melhoraram de forma significativa a
potência do salto vertical, porém não encontraram diferenças entre os grupos,
ressaltando ainda que o treino aquático promoveu menos stress posterior.
Robinson et al (2004)
encontraram resultados semelhantes para aumento na altura do salto vertical
entre grupo água x terra, porém com menos dor muscular tardia para o grupo que
treinou na água
Conclusões
É possível obter ganhos
significativos de FM e HM com programas de atividades aquáticas específicos,
sendo uma alternativa para aqueles que não podem ou não gostam de realizar
atividades contra resistência fora d´água.
O uso de equipamentos não é
determinante, como demonstram alguns estudos (BORREANI et al., 2014; KRUEL et
al., 2010), porém pode ser um fator de variação do treino.
São necessários mais
estudos, pois boa parte dos trabalhos foca em indivíduos mais velhos,
destreinados ou com enfermidades.
Apesar dos resultados
promissores, ainda não dá para comparar com os resultados obtidos nos
exercícios contra resistidos fora d´água para aqueles que já são condicionados
e treinados ou que desejam ganhos estéticos maiores em HM .
Para o treinamento
desportivo o treino na água parece ser um grande aliado no treino de força
explosiva para salto vertical, com a vantagem de produzir menos dor muscular
tardia, o que significa melhor treino no dia seguinte.
Apesar de algumas limitações
para o treino de FM os exercícios aquáticos para população em geral podem ser
uma alternativa para o aumento da FM e HM, desde que as sessões sejam
específicas para este fim. Com ganhos que podem melhorar a qualidade de vida e
capacidade funcional.
Referências
bibliográficas
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Me ajudou na dúvida que tinha sobre hipertrofia na Hidroginástica.
ResponderExcluirExcelente.
ResponderExcluirSó não achei a fonte HORTOBAGYI et. al. (1998) nas suas referencias bibliográficas.